

Desde a publicação da Lei 13.467/2017, que realizou a reforma trabalhista, o Judiciário tem enfrentado inúmeros debates sobre a constitucionalidade das reformas operadas. Entre os pontos discutidos, inaugurou-se o debate relativo à ilegalidade das alterações promovidas na contribuição sindical (art. 578 da CLT).
A tese que vem ganhando voz
e inclusive já é adotada por alguns julgadores é de que apenas Lei Complementar
poderia alterar a regra-matriz de incidência da Contribuição Sindical. Logo, a
alteração promovida por Lei Ordinária viola a hierarquia das normas.
Apesar de sedutora, a tese
está equivocada.
Inicialmente, importante
destacar que o Supremo Tribunal Federal possui jurisprudência pacífica no
sentido de que inexiste hierarquia entre Lei Complementar e Lei Ordinária (Ação
Declaratória de Constitucionalidade nº 1, rel. Min. Moreira Alves). A distinção
entre as duas espécies normativas, em verdade, se dá em razão da matéria
regulada, de modo que apenas as matérias expressamente assinaladas pela
Constituição como reservadas à Lei Complementar exigem a produção dessa espécie
normativa.
Sendo assim, há de se
esclarecer a função desempenhada pela Lei Complementar no Sistema Tributário
Nacional.
Sabe-se que o direito tem
como papel regular a conduta humana. No entanto, o Direito Positivo não dispõe
apenas de normas de conduta. Ele também se autorregula, por meio de normas de
estrutura.
Sobre o conceito de normas
ou regras de estrutura e conduta ensina Paulo de Barros Carvalho:
“Numa
análise mais fina das estruturas normativas, vamos encontrar unidades que têm
como objetivo final ferir de modo decisivo os comportamentos interpessoais,
modalizando-os deonticamente como obrigatórios (O), proibidos (V) e permitidos
(P), com o que exaurem seus propósitos regulativos.”[1]
Essas regras que
regem de forma decisiva os comportamentos interpessoais, ou seja, regulamentam
a conduta do indivíduo, são denominadas “regras de conduta”.
Porém, há normas
que visam regrar a forma de produção de outras normas. Essas normas “instituem condições, determinam
limites ou estabelecem outra conduta que servirá de meio para a construção de
regras do primeiro tipo”[2] .
São as denominadas “regras de estrutura”.
Partindo para o exame do
texto positivo da Carta Magna, o art. 146, III, da CF define que as normas
gerais em matéria tributária devem ser editadas por Lei Complementar,
reconhecida pela doutrina como de caráter nacional.
Ato contínuo, o art. 150, I,
da CF determina que é vedada a exigência ou aumento de tributo sem lei que o
estabeleça. Ora, o texto constitucional não fala “Lei Complementar”, mas “Lei”.
Então, por que o art. 146,
III, da CF fala em “Lei Complementar” e o art. 150, I, da CF se limita à “Lei”?
A resposta está no papel desempenhado por cada uma dessas normas no Sistema
Tributário Nacional, podendo ocupar a função de normas de estrutura ou normas
de conduta.
A ordem jurídica
brasileira é um “sistema
de normas, algumas de comportamento, outras de estrutura, concebido pelo homem
para motivar e alterar a conduta no seio da sociedade”[3].
Considerando o sistema federativo e a preocupação de uniformidade das normas
tributárias, a Constituição de 1988 concedeu à Lei Complementar Nacional papel
fundamental de regra estruturante das normas de incidência dos impostos. Porém,
ela é insuficiente à constituição da obrigação tributária. A regra de conduta
de incidência dos tributos só será criada por lei ordinária do Ente Federado
competente, a teor do art. 150, I, da CF.
Há uma enorme diferença entre estabelecer normas
gerais em matéria tributária, tais como o fato gerador, base de cálculo e
contribuintes, e, de outra banda, instituir o tributo em si. Essa diferença se
resume no fato de que a Lei Complementar do art. 146, III, da CF não determina comportamento do
contribuinte, mas apenas estabelece as normas de estrutura dos tributos. Assim,
cabe à lei ordinária do Ente Federado definir as normas de conduta a serem
respeitadas pelo contribuinte, instituindo a obrigação tributária.
Voltando-se ao
exame da Contribuição Sindical, o art. 578 e seguintes da CLT
fixa regra geral da contribuição ou institui o tributo? É inequívoco que a CLT
institui a regra-matriz de incidência da Contribuição Sindical, revelando-se,
assim, norma de conduta da contribuição.
Portanto, considerando que a
CLT não é norma de estrutura da Contribuição Sindical, mas norma de conduta que
institui a regra-matriz de incidência tributária, resta inequívoca a legalidade
da Lei 13.467/2017, norma de conduta apta a modificar a norma de incidência da
Contribuição Sindical, nos termos do art. 150, I, da CF.
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