Inconstitucionalidade do Exame de Qualificação para Despachante Aduaneiro




As regras e requisitos para a atividade de despachante aduaneiro estão  parcialmente disciplinados no Dec.-Lei 2472/1988, que fixou no parágrafo 3º de seu art. 5º verdadeira delegação externa ao Poder Executivo para dispor sobre a forma de investidura e  demais critérios para o exercício da função de Despachante Aduaneiro, atualmente  regulamentado pelo Decreto 6759/2009 (Regulamento Aduaneiro).


Ocorre que a Constituição de 1988 impõe regra diversa sobre  regulamentação das condições para o exercício de profissões privadas. Conforme a atual regra constitucional presente no art. 22, XVI da  CF/1988, compete privativamente à União por meio de lei fixar os critérios para o exercício de  profissões, estabelecendo os requisitos capacitários objetivos que apresentem relação com as  funções a serem exercidas.
Portanto, o Poder Legislativo não pode abdicar da competência  institucional disposta no art. 22, XVI da CF/1988 para permitir que o Poder Executivo produza  regra de reserva constitucional parlamentar. 
O único mecanismo constitucional que autoriza o Poder Legislativo  delegar a reserva constitucional de legislar é o instrumento da Lei Delegada. Contudo, a  regulamentação da atividade de despachante aduaneiro pelo Poder Executivo ocorreu sem o  cumprimento dos requisitos previstos no art. 68 da CF/1988.

Destaca-se, sobretudo, que sequer pode existir delegação sobre o tema. O livre exercício de qualquer profissão é direito individual previsto no art. 5º, XIII, da CF/1988, de  modo que as condições para o exercício de profissões não se mostram passíveis de delegação,  por vedação constitucional prevista no art. 68, §1º, I, da CF/1988.
A leitura conjunta dos dispositivos constitucionais demonstra de forma  inequívoca que o §3º, art. 5º do Dec.-Lei 2472/1988 não foi recepcionado pela Constituição vigente, pois na ordem atual apenas a lei federal stricto sensu pode impor condições para o  exercício de profissões, sendo o poder de polícia exercido pela administração indireta na pessoa do Conselho de Fiscalização Profissional (entidade autárquica).
A atividade de despachante aduaneiro não se enquadra  em matéria regulamentada pela Receita Federal para que esta possa realizar exame de  qualificação técnica. Apenas com a criação de um Conselho de Fiscalização Profissional a União  poderia aplicar, por meio de lei, restrições ao livre exercício da atividade de despachante  aduaneiro, que seria fiscalizada não pela Receita Federal, mas por um conselho próprio.
Claro está que após a promulgação da Constituição de 1988 as condições  para o exercício das profissões de Ajudante de Despachante Aduaneiro e de Despachante  Aduaneiro só poderiam ser validamente estipuladas por Lei e não por mero Decreto, como fixado  pelo Decreto 6759/2009 (Regulamento Aduaneiro).
Assim, o art. 5º, §3º do Dec.-Lei 2472/1988 infringe tema sujeito à reserva  constitucional de lei, de modo que, ao contrário do disposto do decreto-lei supracitado, o Poder  Executivo não está autorizado a utilizar de regulamento delegado (atualmente materializado no  Decreto 6759/2009 – Regulamento Aduaneiro) para disciplinar tema restrito à lei (condições  para o exercício de profissões).
Portanto, resta evidente a inconstitucionalidade do art. 5º, §3º do Dec.-Lei 2472/1988, pois a Constituição Federal de 1988 não autoriza ao Poder Executivo que este  promova a delegação legislativa sobre as condições para o exercício de atividade profissional privada.

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