Nenhum
ato regulamentar pode criar obrigações ou restringir direitos, sob pena de
incidir em domínio constitucionalmente reservado ao âmbito de atuação material
da lei em sentido formal. (RE 318.873- AgR/SC, ReI. Min. CELSO DE MELLO, v.g.)
O inciso XI do Art. 37 permite a auto
aplicação do teto constitucional, matéria pacífica na jurisprudência e
consolidado está tal entendimento.
Contudo, autoaplicável é o teto sobre
vencimentos pagos ao servidor por um mesmo ente federado. Quando o servidor
exerce função em órgãos de entes federados distintos, p. ex. médico servidor em
hospital estadual e federal, o teto deve ser aplicado com base no sistema
integrado de dados.
A
Lei 10.887/2004 prevê em seu art. 3° a criação, por parte da União, Estados e
Municípios, do sistema integrado de dados relativos às remunerações, proventos
e pensões, conforme segue:
Art. 3º Para os fins do disposto no
inciso XI do art. 37 da Constituição Federal, a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios instituirão sistema integrado de dados relativos às
remunerações, proventos e pensões pagos aos respectivos servidores e militares,
ativos e inativos, e pensionistas, na forma do regulamento. (GRIFO NOSSO)
Embora até hoje não instituído o sistema integrado
de dados a que alude o art. 3º da Lei n. 10.887/2004 há órgãos administrativos estabelecendo mecanismos de controle não previstos em lei ou
decreto, criando obrigações e impndo sanções aos agentes que receberem
remuneração por mais de uma fonte pagadora.
O controle
do valor devido ao servidor ou membro de poder que possua mais de uma fonte de
remuneração por ato normativo de menor hierarquia é controle inconstitucional
que viola a reserva legal, caracterizando abuso de poder. São exigências
ilegais e manifestamente arbitrárias, pois usurpam a competência legislativa.
Através das consultas realizadas junto ao Tribunal
de Contas da União (TC 001.816/2004-1, TC 009.585/2004-9, TC 017.351/2005-2, TC
020.132/2005-8, TC 023.986/2006-4) podemos observar que, em razão da aplicação arbitrária
dos mecanismos de controle criados por ato normativo de menor hierarquia, a
própria implementação operacional do teto acaba sendo prejudicada.
Há
magistrados que entendem que a aplicação do texto constitucional não depende de
edição de lei para concretizar os efeitos da Constituição, visto o teto ser
autoaplicável.
Sobre o afirmado, vale destacar trecho do
parecer emitido pelo Procurador-Geral Dr. Lucas Rocha Furtado no TC-001.816/2004-1 quanto à
aplicação da Lei 10.887/2004 e Art. 37, XI da CF:
IV
Da resposta e da fundamentação à
primeira questão
A primeira questão foi
formulada nos seguintes termos:
‘Como devem proceder os administradores
públicos na eventualidade de um servidor público acumular vencimentos ou
proventos? O corte deve ser efetuado por que entidade ou órgão? É possível
aplicar, a essas situações, a regra do teto remuneratório sem que haja a devida
e precisa regulamentação do tema?’
Partimos do princípio de que o
consulente usa os termos servidor público, vencimentos e proventos de
forma ampla, tal qual nos reportamos logo acima. Por essa razão, assim também
trataremos tais vocábulos daqui em diante.
Em resposta à questão acima,
somos de opinião de que, enquanto não
advier lei reguladora da matéria, o teto constitucional só pode incidir sobre
remunerações consideradas de per si, ou seja, não tomadas cumulativamente com
outra ou outras remunerações percebidas pelo mesmo servidor, pela atividade ou
pela inatividade, mesmo que provenientes de um único ente pagador.
[...]
Observe-se que o texto
constitucional (art. 37, XI), ao dispor sobre o teto remuneratório, estende a
eficácia da norma a todas as unidades federadas brasileiras, bem como a todos
os poderes da República, o que significa dizer que, para cada uma das hipóteses de incidência do teto remuneratório,
resulta uma dificuldade operacional diferente, cujas respectivas soluções,
por não estarem ainda reguladas, ficam a cargo de responsáveis diversos,
situados em órgãos e esferas governamentais diversas, dotadas cada qual de sua
própria autonomia político-administrativa.
[...]
A bem da verdade, entendemos
que, em regra, os órgãos públicos em
geral não possuem meios de processar informações, mesmo vindo a tomar
conhecimento das mesmas, demandando a edição de lei que regule devidamente a
matéria e que, de alguma forma, discipline e mitigue os efeitos das autonomias
administrativa e política das diversas fontes pagadoras. Do contrário, torna-se
praticamente impossível a implantação da sistemática constitucional em tela.
Nada obstante, nos casos de
acúmulo de remunerações recebidas de uma única fonte pagadora pelo mesmo
servidor, é perfeitamente possível proceder à dedução do montante excedente ao
limite constitucional, em função da possibilidade prática de se identificar,
processar e efetivamente promover a redução do excedente.
[...]
Nada obstante, cumpre salientar
não ser este Ministério Público desfavorável à aplicação da norma
constitucional sobre os casos de acumulação remuneratória. Não somos contrários
à dicção da Resolução CNJ nº 14/2006, segundo a qual uma das hipóteses de
incidência do teto constitucional de remuneração é justamente a de ‘percepção
cumulativa de remuneração, proventos e pensões, de qualquer origem, nos termos do
art. 37, inciso XI da Constituição Federal (...)’.
[...]
Alfim, repetindo o que já
afirmávamos no início desta seção, somos
de opinião de que, enquanto não advier lei reguladora da matéria, o teto
constitucional só deve incidir sobre remunerações consideradas de per si, ou seja, não tomadas cumulativamente com
outra ou outras remunerações, proventos ou pensões percebidos pelo servidor,
pela atividade ou pela inatividade, mesmo que provenientes de uma única
fonte pagadora. (grifo
nosso).
O
parecer do Procurador-Geral Dr. Lucas Rocha Furtado supratranscrito é pontual e
aborda precisamente a matéria. Através de seu parecer fica claro que a edição
de lei regulamentar prevista no art. 3° da Lei 10.887/2004 é fundamental para a
adequada aplicação do teto constitucional.
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