A pena de perdimento na Importação por Conta e Ordem




Aqui já foi falado das particularidades da importação por conta e ordem de terceiro. Como reconhecido pela própria Receita Federal "embora a atuação da empresa importadora possa abranger desde a simples execução do despacho de importação até a intermediação da negociação no exterior, contratação do transporte, seguro, entre outros, o importador de fato é a adquirente, a mandante da importação, aquela que efetivamente faz vir a mercadoria de outro país, em razão da compra internacional; embora, nesse caso, o faça por via de interposta pessoa – a importadora por conta e ordem –, que é uma mera mandatária da adquirente".

A incompreensão dessa modalidade de importação vem gerando inúmeras injustiças com as tradings importadoras. Hoje, destacamos a pena de perdimento.

Diferentes são as causas que levam à pena de perdimento. Para o debate aqui proposto, vale apontar a pena de perdimento aplicada com fundamento em declaração falsa de conteúdo.

Sobre a pena de perdimento por falsa declaração de conteúdo, prevista no art. 689, inciso XII, do Decreto 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro), dispõe § 4º do artigo citado: "Considera-se falsa declaração de conteúdo aquela constante de documento emitido pelo exportador estrangeiro, ou pelo transportador, anteriormente ao despacho aduaneiro".

Pois bem, há situações em que a trading sequer registra a Declaração de Importação, de modo que inexiste participação da trading na operação ou, se existe, é mínima. Mesmo nessas condições a trading acaba por ser penalizada, muitas vezes que respondendo criminalmente pela atitude exclusiva da adquirente.

Em recente decisão, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região enfrentou a matéria, ao examinar a Apelação Cível 5020874-75.2015.4.04.7200/SC, afastando a responsabilidade da trading importadora:

AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO E DE DECISÃO PROFERIDA EM PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. PERDIMENTO DE MERCADORIAS. IMPORTAÇÃO POR CONTA E ORDEM. Se não há prova de que a autora concorreu para as práticas ilícitas apuradas pela autoridade fiscal, não há como lhe atribuir responsabilidade pelo perdimento das mercadorias.

No precedente citado, o Tribunal reconheceu que não provada a participação da trading importadora, há de ser afastada qualquer penalidade a ela imputada.

É da decisão:

A autora se insurge quanto à atribuição de sua responsabilidade pelos fatos apurados. 
Razão lhe assiste. Não há prova de que a autora concorreu para as práticas ilícitas apuradas pela autoridade fiscal, sendo que ela sequer registrou a declaração de importação. Não há como subsistir a presunção de que a autora declarou falsamente o conteúdo da carga e falsificou os documentos necessários ao regular despacho aduaneiro. É necessária a prova da participação consciente no ilícito.
Nas razões de apelação, a autora tece ponderações relevantes, que merecem ser consideradas: 

'Não se pode deixar de ressaltar, também, que na importação por conta e ordem o importador é mero prestador de serviço, e, nesta condição, não estabelece qualquer relação de propriedade com as mercadorias importadas, tampouco as comercializa. A remuneração de seus serviços é em valor fixo, por despacho aduaneiro realizado, conforme se colhe do contrato de importação por conta e ordem juntado aos autos (evento 1OUT9). Nesse contexto evidencia-se que não haveria qualquer proveito à Apelante em participar de operação de comércio exterior tendo por objeto mercadorias diversas das declaradas nos documentos comerciais. Houvessem sido as mercadorias descritas corretamente nos documentos comerciais, e o resultado a ser auferido pela Apelante seria rigorosamente o mesmo, não havendo qualquer motivo para esta colocar em xeque seu histórico mais de 12 anos de operações de comércio exterior sem ter sofrido qualquer autuação da Receita Federal. Evidentemente o interesse em importar mercadorias falsificadas e subfaturadas era do adquirente, o qual iria recolher um montante de tributos significativamente menor, além do que iria colocar as mercadorias a venda no mercado interno, provavelmente com altas margens de agregação de valor.' 

Desse modo, merece ser provido o recurso e julgada procedente a ação para excluir a parte autora do Auto de Infração e Termo de Apresentação de Guarda Fiscal

O precedente apenas confirma o princípio da pessoalidade da pena, positivada no art. 5º, XLV, da CF, que diz expressamente: "nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido".

Existindo situação semelhante, cabe à trading buscar o Judiciário para sanar os excessos da administração fiscal, de modo a limitar a penalidade à empresa adquirente.

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