Os bens
imóveis possuem expressão econômica, de modo que atendem ao comando do artigo
3º do CTN por exprimir valor.
Como
destaca Leandro Paulsen “O CTN prevê, é certo, em seu art. 156 e demais
dispositivos que regulam a extinção do crédito tributário, a possibilidade de a
legislação dispor sobre compensação de créditos do contribuinte e do Fisco e de
autorizar a dação de bens imóveis em pagamento. Mas a forma de liberação, até
porque sempre se reportará a uma valor em moeda correspondente à obrigação
tributária, não altera a essência da natureza da prestação[1]”.
Inicialmente,
há de se fixar a premissa ancorada no firme entendimento do STF de que o
ordenamento jurídico brasileiro não admite a constitucionalidade superveniente,
ou seja, a norma editada em desacordo com as regras constitucionais à época de
sua publicação não passam a ter constitucionalidade, ainda que haja alteração
constitucional por meio de emenda[2].
Partindo
para o exame da questão, o art. 146, III, da Constituição Federal define que as
normas gerais em matéria tributária (normas de estrutura) devem ser editadas
por Lei Complementar de caráter nacional.
Para
parte da doutrina e jurisprudência a edição da norma de conduta, no domínio de
competência e segundo as conveniências do Ente Federativo competente, deve se
restringir às espécies de extinção previstas no art. 156 do CTN.
Essa foi
a posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal na Medida Cautelar na ADI
1917/DF, em 19.09.2003, posteriormente ratificada em julgamento de mérito de
24.08.2007. Segundo o posicionamento da Corte naquela oportunidade, o ente
federado não pode criar nova forma de extinção da obrigação tributária. Deve-se
respeitar o rol do art. 156 do CTN, entendido como taxativo.
Desse
modo, o posicionamento majoritário da jurisprudência entende que a norma de
conduta editada em período anterior à Lei Complementar 104/2001 está eivada de
inconstitucionalidade.
No
entanto, não compartilho desse posicionamento.
As normas
de estrutura não possuem aptidão para definir condutas, razão pela qual as
obrigações tributárias são instituídas pelas normas de conduta produzidas pelos
entes federados competentes.
O
posicionamento pacífico da doutrina e jurisprudência é no sentido de que a
prestação tributária (art. 3º do CTN) não se restringe à forma “dinheiro”, mas
a uma expressão econômica.
O Supremo
Tribunal Federal já fixou que a ausência de norma de estrutura nacional
prevista no art. 146 da CF não impede o exercício da competência tributária por
meio da norma de conduta emanada pelo Estado Membro, por comando do art. 24,
§3º, da CF (Ex.: Instituição do IPVA: ADI 2.298-MC; RE 167.777/SP). Essa é a leitura
do art. 34, §3º, do ADTC: “Promulgada a Constituição, a União, os Estados, o
Distrito Federal e os Municípios poderão editar as leis necessárias à aplicação
do sistema tributário nacional nela previsto”. Não por outra razão o art. 6º do
CTN destaca “A atribuição constitucional de competência tributária compreende a
competência legislativa plena”.
O
posicionamento adotado pela Corte Suprema na ADI 1917/DF não pode ser
generalizada, pois aquele posicionamento está assentado em
inconstitucionalidade oriunda do regime de dação criado pelo Distrito Federal,
que exigia como pagamento a dação de materiais destinados a atender programas
do Governo do DF, o que violaria a Lei de Licitações. Portanto, a
inconstitucionalidade da norma distrital não advém de ausência da lei
complementar nacional, mas da violação a princípios do direito administrativo.
A
observação aqui apontada também foi identificada pelo STF no julgamento da
Medida Cautelar na ADI 2405/RS, em 17.02.2006 (pendente de julgamento de
mérito), que mudou sua orientação, alinhando-se ao posicionamento adotado nos
precedentes relativos ao IPVA. Portanto, o rol do artigo 156 do CTN não é
taxativo.
No mais,
ainda que se considerasse vedada a instituição de norma de conduta sem prévia
norma de estrutura nacional, o art. 156, I, do CTN prevê o pagamento como forma
de extinção da obrigação tributária. A
dação em pagamento é espécie do gênero “pagamento”, de modo que eventual norma
do ente tributante inserindo a modalidade de pagamento por dação não violaria o
comando do art. 146, III, da CF.
Por fim,
o art. 11 da Lei de Execuções Fiscais (Lei 6.830/1980) admite como forma de
extinção do crédito tributário executado: I - dinheiro; II - título da dívida
pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa; III - pedras
e metais preciosos; IV - imóveis; V - navios e aeronaves; VI - veículos; VII -
móveis ou semoventes; e VIII - direitos e ações. Ora, a recusa do pagamento por
meio da dação é ignorar os princípios da finalidade e eficiência que norteiam a
administração pública.
Assim,
entendo que há violação ao art. 146 da CF apenas quando a norma de conduta
edita regra contrária à expressamente prevista na lei complementar nacional
(norma de estrutura), o que não é o caso. Encerrando a análise, a ausência de
vedação expressa no art. 156 do CTN não impede a criação de outras modalidades
de extinção da obrigação tributária, que se dará por norma de conduta do ente
tributante, razão pela qual as normas anteriores à Lei Complementar 104/2001
são válidas, desde que respeitados os princípios gerais do direito.
[1]PAULSEN, Leandro. Direito
Tributário Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da
jurisprudência. 15 ed. p. 664.
[2] ADI 2, rel. min. Paulo
Brossard, julgamento em 6-2-1992, Plenário, DJ de 21-11-1997. No mesmo sentido:
RE 343.801-AgR, rel. min. Ayres Britto, julgamento em 20-3-2012, Segunda Turma,
DJE de 26-6-2012. Vide: ADI 2.158 e ADI 2.189, rel. min. Dias Toffoli,
julgamento em 15-9-2010, Plenário, DJE de 16-12-2010.
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