ICMS na Energia Elétrica - Posicionamento dos Tribunais - repositório




    

Nos últimos anos o judiciário vem enfrentando uma crescente discussão em torno dos tributos incidentes sobre a geração, transmissão e distribuição de energia elétrica. Nesse setor, a carga tributária que chega ao consumidor final representa 40% do valor da fatura.

Se 40% da fatura é formada por tributos, pode-se imaginar tamanha fonte de receita que as empresas de energia representam. Em Santa Catarina a CELESC - Centrais Elétricas de Santa Catarina é a 2ª maior arrecadadora de ICMS, segundo informações por ela mesmo divulgadas: http://www.celesc.com.br/portal/index.php/celesc-distribuicao/perfil

Dessa forma, é inevitável que as questões jurídicas sobre a tributação incidente na energia elétrica sejam viciadas de conteúdo de ordem econômico/fiscal. Não por acaso a jurisprudência pátria é vacilante, de modo que cadas Estado possui um posicionamento diferente sobre a ilegalidade das alíquotas de ICMS incidentes na energia ou sobre a base de cálculo desse imposto.

Na intenção de unificar os diferentes posicionamentos adotados pelos Tribunais quanto à incidência do ICMS na energia elétrica, segue abaixo o compilado do atual cenário jurisprudencial:




- ALÍQUOTA DO ICMS INCIDENTE NA ENERGIA ELÉTRICA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SELETIVIDADE

A tese sobre a aplicabilidade do princípio da seletividade na alíquota do ICMS parte do pressuposto que, segundo tal princípio, quanto maior a essencialidade do bem, menos deverá ser a alíquota do ICMS sobre ele incidente.

Essa tese ganhou força a partir da decisão do STF no Agravo Regimental interposto no RE 634.457, do Rio de Janeiro. Nesse precedente, julgado sem repercussão geral, o STF manteve a decisão do Tribunal do Rio de Janeiro que reconheceu a inconstitucionalidade da majoração da alíquota do ICMS incidente na energia elétrica, em respeito ao princípio da seletividade:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. ICMS. SERVIÇO DE ENERGIA ELÉTRICA E DE TELECOMUNICAÇÕES. MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA. PRINCÍPIO DE SELETIVIDADE. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PELO ÓRGÃO ESPECIAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

I – Não obstante a possibilidade de instituição de alíquotas diferenciadas, tem-se que a capacidade tributária do contribuinte impõe a observância do princípio da seletividade como medida obrigatória, evitando-se, mediante a aferição feita pelo método da comparação, a incidência de alíquotas exorbitantes em serviços essenciais.
II – No caso em exame, o órgão especial do Tribunal de origem declarou a inconstitucionalidade da legislação estadual que fixou em 25% a alíquota sobre os serviços de energia elétrica e de telecomunicações – serviços essenciais – porque o legislador ordinário não teria observado os princípios da essencialidade e da seletividade, haja vista que estipulou alíquotas menores para produtos supérfluos.
III – Estabelecida essa premissa, somente a partir do reexame do método comparativo adotado e da interpretação da legislação ordinária, poder-se-ia chegar à conclusão em sentido contrário àquela adotada pelo Tribunal a quo. IV – Agravo regimental a que se nega provimento. 
(RE 634457 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 05/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-157 DIVULG 14-08-2014 PUBLIC 15-08-2014)


A matéria é hoje objeto de Repercussão Geral no RE 714.139/SC: Tema 745/STF: Alcance do art. 155, § 2º, III, da Constituição federal, que prevê a aplicação do princípio da seletividade ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS.

Apesar de estar pendente de julgamento, a Procuradoria-Geral da República já manifestou parecer favorável aos contribuintes, sustentando a necessidade de redução da alíquota do ICMS incidente na energia elétrica em respeito ao princípio da seletividade.

Apesar dos indicativos no STF pela inconstitucionalidade, inúmeros Tribunais ainda sustentam a inexistência de violação ao princípio da seletividade:


SELETIVIDADE ALÍQUOTA ICMS ENERGIA – Posicionamento Jurisprudencial
TRIBUNAL
POSIÇÃO
TJAC

TJAL

TJAP

TJAM

TJBA

TJCE
FAVORÁVEL - Arguição de Inconst. 0398682-23.2010.8.06.0001
TJDFT

TJES

TJGO

TJMA

TJMT

TJMS

TJMG

TJPA

TJPB

TJPR
CONTRÁRIO - Incidente Declaração Inconst. 174723-7/01
TJPE

TJPI
FAVORÁVEL - Incidente Inconstitucionalidade 2010.0001.005102-5
TJRJ
FAVORÁVEL - Arguição de Inconstitucionalidade 2008.004.00268
TJRN

TJRS

TJRO

TJRR

TJSC
CONTRÁRIO - Precedente MS 2011/017834-5
TJSP
CONTRÁRIO - Arguição de Inconstit. 0041018-45.2016.8.26.0000
TJSE

TJTO



Dessa forma, a uniformização jurisprudencial só ocorrerá com o julgamento da matéria pelo STF.





- EXCLUSÃO DA TUST/TUSD DA BASE DE CÁLCULO DO ICMS INCIDENTE NA ENERGIA ELÉTRICA

Outra tese com repercussão na tributação incidente na energia elétrica é a que defende a exclusão da tarifa cobrada pelo uso do sistema de distribuição (TUSD), bem como a tarifa correspondente aos encargos de transmissão (TUST), da base de cálculo do ICMS incidente na energia elétrica.

Essa tese sustenta que o ICMS não pode incidir sobre valores que não representam o preço da energia elétrica consumida.

O Superior Tribunal de Justiça possuía pacífica jurisprudência no sentido de ser ilegal a inclusão da TUST/TUSD na base de cálculo do ICMS recolhidos pelos consumidores livres. No entanto, com o crescente número de ações também pelos consumidores cativos, a Primeira Turma do STJ abriu divergência sobre a matéria (RE 1.163.020/RS, DJe. 27.03.2017), se posicionando pela legalidade da inclusão da TUST/TUSD até mesmo para os consumidores livres:

TRIBUTÁRIO. ICMS. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. BASE DE CÁLCULO. TARIFA DE USO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO (TUSD). INCLUSÃO. 

1. O ICMS incide sobre todo o processo de fornecimento de energia elétrica, tendo em vista a indissociabilidade das suas fases de geração, transmissão e distribuição, sendo que o custo inerente a cada uma dessas etapas – entre elas a referente à Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD) – compõe o preço final da operação e, consequentemente, a base de cálculo do imposto, nos termos do art. 13, I, da Lei Complementar n. 87⁄1996.
2. A peculiar realidade física do fornecimento de energia elétrica revela que a geração, a transmissão e a distribuição formam o conjunto dos elementos essenciais que compõem o aspecto material do fato gerador, integrando o preço total da operação mercantil, não podendo qualquer um deles ser decotado da sua base de cálculo, sendo certo que a etapa de transmissão⁄distribuição não cuida de atividade meio, mas sim de atividade inerente ao próprio fornecimento de energia elétrica, sendo dele indissociável. 
3. A abertura do mercado de energia elétrica, disciplinada pela Lei n. 9.074⁄1995 (que veio a segmentar o setor), não infirma a regra matriz de incidência do tributo, nem tampouco repercute na sua base de cálculo, pois o referido diploma legal, de cunho eminentemente administrativo e concorrencial, apenas permite a atuação de mais de um agente econômico numa determinada fase do processo de circulação da energia elétrica (geração). A partir dessa norma, o que se tem, na realidade, é uma mera divisão de tarefas – de geração, transmissão e distribuição – entre os agentes econômicos responsáveis por cada uma dessas etapas, para a concretização do negócio jurídico tributável pelo ICMS, qual seja, o fornecimento de energia elétrica ao consumidor final. 
4. Por outro lado, o mercado livre de energia elétrica está disponibilizado apenas para os grandes consumidores, o que evidencia que a exclusão do custo referente à transmissão⁄distribuição da base de cálculo do ICMS representa uma vantagem econômica desarrazoada em relação às empresas menores (consumidores cativos), que arcam com o tributo sobre o "preço cheio" constante de sua conta de energia, subvertendo-se, assim, os postulados da livre concorrência e da capacidade contributiva.
5. Recurso especial desprovido.


A partir de então a jurisprudência pátria passou a divergir sobre a matéria, de modo que os Tribunais iniciaram movimento para suspender os processos e uniformizar a matéria individualmente, por meio de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. Até o momento 05 Tribunais promoveram o IRDR:

TUST ENERGIA – Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas
TRIBUNAL
IRDR
TJAC

TJAL

TJAP

TJAM

TJBA

TJCE

TJDFT

TJES

TJGO

TJMA

TJMT

TJMS
TJMG
TJPA

TJPB

TJPR
TJPE

TJPI

TJRJ
TJRN

TJRS

TJRO

TJRR

TJSC
TJSP
TJSE

TJTO



Importante destacar que o Supremo Tribunal Federal rejeitou a declaração de repercussão geral sobre a matéria (Tema 956/STF, leading case RE 1.041.816), sustentando inexistir afronta ao texto constitucional.

Dessa forma, caberá ao STJ dar a palavra final sobre o tema.

Atualmente a matéria está em discussão na Primeira Seção do STJ, por meio dos Embargos de Divergência 1.163.020/RS, afetado como repetitivo, em conjunto com o REsp 1.699.851/TO e  REsp 1.692.023/MT, pendentes de julgamento. Esses recursos visam uniformizar o entendimento em todo território nacional.




Comentários